Brejo das Almas

Carlos Drummond de Andrade

Coisa miserável

Coisa miserável,
suspiro de angústia
enchendo o espaço,
vontade de chorar,
coisa miserável,
miserável.
 
Senhor, piedade de mim,
olhos misericordiosos
pousando nos meus,
braços divinos
cingindo meu peito,
coisa miserável
no pó sem consolo,
consolai-me.
 
Mas de nada vale
gemer ou chorar,
de nada vale
erguer mãos e olhos
para um céu tão longe,
para um deus tão longe
ou, quem sabe? para um céu vazio.
 
É melhor sorrir
(sorrir gravemente)
e ficar calado
e ficar fechado
entre duas paredes,
sem a mais leve cólera
ou humilhação.

1. O primeiro verso deve ser lido como
a) apóstrofe
b) constatação
c) interrogação
d) metáfora
e) vocativo
 
2. A respeito dos sentidos encadeados pelo autor, assinale a alternativa incorreta.
a) Na terceira estrofe, o eu lírico se refere a um deus que não interfere nos destinos da humanidade, a um deus que não existe.
b) Nos últimos versos do poema, o eu lírico conclui que, diante das limitações humanas, só podemos manter a dignidade e aceitar.
c) No último verso da primeira estrofe, o eu lírico se certifica da miséria da “coisa” que não lhe sai da memória.
d) O sexto verso da segunda estrofe deve ser lido como referência e não como vocativo.
e) O verso “enchendo o espaço” sugere que a angústia toma toda a atenção do eu lírico.
 
3. A palavra “cingindo” – segunda estrofe – pode ser substituída adequadamente por
a) abraçando
b) cortando
c) puxando
d) sangrando
e) sufocando
 
4. A respeito dos recursos literários utilizados pelo poeta, assinale a alternativa incorreta.
a) A conjunção adversativa “mas”, no início da terceira estrofe, indica o conflito entre o desejo e a razão que se estabelece no eu lírico.
b) Drummond recorre à figura de linguagem denominada anáfora (repetição das mesmas palavras nos inícios dos versos ou das frases) para ir além do que já seria inaceitável: é difícil “ficar calado” e mesmo assim não é o bastante; é preciso ficar calado e “fechado / entre duas paredes, / sem a mais leve cólera / ou humilhação”.
c) Na primeira estrofe, o poeta evita pronomes e verbos na segunda pessoa para não descaracterizar um vocativo do primeiro verso.
d) O autor emprega a segunda pessoa do plural do imperativo afirmativo – uma tradição bíblica – para apontar o vocativo na palavra “Senhor” e não no vocábulo “coisa”.
e) O poeta usa os parênteses, na última estrofe, para definir o sorriso que propõe no primeiro verso “É melhor sorrir”.
 
5. Na terceira estrofe, a expressão “de nada” deve ser avaliada sintaticamente como
a) adjunto adverbial
b) complemento nominal
c) objeto direto preposicionado
d) objeto direto simples
e) objeto indireto
 
6. O sintagma “erguer mãos e olhos” – terceira estrofe – deve ser mais bem compreendido como
a) oração objetiva direta
b) oração subjetiva
c) oração subjetiva reduzida de infinitivo
d) sujeito composto
e) sujeito simples
 
7. O trecho “para um céu tão longe” – terceira estrofe – deve ser lida como
a) adjunto adnominal
b) adjunto adverbial
c) complemento nominal
d) objeto direto
e) objeto indireto